Por que ninguém é feliz para sempre? - Vó? - Oi? - O que acontece depois do "Felizes para Sempre?" A avó até se ajeitou na cadeira. Já sabia o que acontecia quando aquelas perguntas começavam. - Como é que você falou, meu bem? - O que acontece depois do "Felizes para Sempre" das historinhas. A princesa encontra o príncipe e vivem felizes-para-sempre..., termina sempre assim... Por que eu não vejo ninguém ser feliz para sempre, então? Ai, ai, ai, pensou a avó. - Sabe, minha querida, tem uma tribo antiga de índios, lá no Novo México, que não acredita na passagem do tempo. Fez menção de perguntar o que aquilo tinha a ver com a sua pergunta, mas a avó colocou a mão na sua boca, como se dissesse, espera. - Esses índios acreditam que existem apenas dois mundos: O mundo das coisas visíveis, e o mundo das coisas invisíveis. - No mundo das coisas visíveis, encontramos o que construímos: a casa, o carro, esse tricô aqui que você sempre interrompe... - E no mundo das coisas invisíveis? - No mundo das coisas invisíveis, encontramos tudo o que não transformamos em realidade; os sonhos, as idéias, as dificuldades, tudo o que ainda está lá, para ser realizado, e que a gente sempre deixa para depois..., - Depois eu vou estudar, depois eu vou tentar, depois eu vou fazer meu sonho se tornar realidade... as pessoas sempre esperam pelo futuro, a época em que serão "felizes para sempre"... - E os índios? - Bem, eles são mais espertos e mais avançados do que nós... como eles não acreditam no tempo, então não acreditam também no futuro, e se não acreditam no futuro, não passam a vida inteira esperando por ele. A menina acendeu aquele vasto sorriso, que usava sempre que as historinhas da vovó clareavam as suas dúvidas. - O que eles fazem então? - Acho que eles tratam de serem felizes todo dia. - Mas eles não tem coisas chatas para fazer? - Que coisas chatas? - Essas que a gente faz todo dia: arrumar a cama, fazer lição de casa, arrumar a casa, comer verduras... - Lógico que fazem. - Como é que podem ir para escola se não acreditam no futuro? Meu pai sempre fala que trabalha e fica mal humorado para que a família tenha "um futuro melhor" ... que temos que estudar para termos "um futuro melhor"... - E o futuro fica mesmo melhor? - Não sei, ele não chegou ainda... Riram gostosamente. - Sabe, querida, o que esses índios acham, é que a felicidade, o "felizes para sempre" só existe nessa passagem, das coisas irrealizadas para as coisas realizadas. Esse é um modelo mais bacana de felicidade: é como se a felicidade fosse um quebra-cabeças que a gente monta todo dia... só que é um quebra cabeças diferente. - Como ele é? - Ele é feito todo dia, com coisas que a gente consegue realizar... as peças são invisíveis, e gente deve procurar por cada uma delas até encontrar. Aí a gente traz as coisas do mundo invisível para o mundo realizado. É como uma oficina. Uma Oficina de Felicidade. Finalmente, a pergunta mais difícil: - Você é feliz, vovó? Sorriu, suavemente. - Sou, minha querida. - Mesmo sendo sozinha? - Mas eu não sou sozinha. Eu tenho você, sua mãe, e uma porção de gente no meu coração, querida. Nunca estou sozinha. - Quando eu ficar velhinha, eu vou ser feliz, então? - Não, meu bem. Quando você ficar criança é que vai ser feliz. - Mas eu já sou criança. - Então, não se esqueça de ser criança quando você crescer, tá bom? - Combinado. - Então vai brincar de construir felicidade, vai. Não precisou falar duas vezes. Saiu correndo brincar. E a avó continuou trançando, em seu tricô, a delicada trama da vida. Boa Tarde!!! Autor: Marco Antonio Spinelli, 37 anos, é médico psiquiatra e analista de orientação junguiana. |
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sábado, 18 de fevereiro de 2012
BOATARDE, MAS BOA TARDE MESMO!!!
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